PARTICIPAÇÃO
POLÍTICA E INTERNET: Uma revisão dos modelos de classificação e as influências
da Internet.
Gustavo Warzocha
Fernandes Cruvinel
1-
INTRODUÇÃO
A participação política vem ganhando
cada vez mais a atenção dos cientistas políticos devido à expansão dos
movimentos de protestos e de novas formas de ação política não diretamente
ligadas ao momento eleitoral (BORBA, 2012). Puerta del Sol (Madri), Praça da
Catalunha (Barcelona), Manifestações 2013 (Brasil) são exemplos desses
movimentos.
Em comum, constatamos que os
movimentos foram organizados, predominantemente, por convocações nas redes
sociais e internet, principalmente via Facebook e Twitter. Dessa forma,
verificamos a importância de se estudar a influência da internet nas formas de
participação política. Para isso utilizaremos dados coletados da rede social
Twitter entre 01/08/2014 e 26/10/2014 com os seguintes termos de busca:
“Dilma”, “Aécio”, “Marina Silva”, “Eduardo Campos”.
Este trabalho está dividido em 3
seções seguidas de uma conclusão, sendo a primeira esta introdução. Na seção 2
faremos uma revisão histórica dos modelos de classificação da participação
política. Mostraremos como os modelos foram sendo refinados na medida em que
novas formas de participação foram surgindo na sociedade. Na seção 3
utilizaremos o modelo proposto por AVELAR (2004) para mostrar como a Internet influencia
a participação e o ativismo digital pelo canal eleitoral.
O objetivo é exemplificar as transformações
ocorridas nesse canal com a utilização da Internet e das redes sociais digitais
durante as eleições de 2014. Para isso, iremos analisar o comportamento de
cidadãos e políticos durante esse período.
2- REVISÃO DOS MODELOS DE
CLASSIFICAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
A tradição de estudos sobre
participação política se inicia com a obra de MILBRATH (1965) que definia
participação como um conjunto de atividades relacionada com o momento
eleitoral.
Ao longo dos anos novas
classificações foram surgindo saindo de uma abordagem unidimensional (momento
eleitoral) para uma abordagem multidimensional (momento eleitoral e
não-eleitoral).
A obra de PIZZORNO (1975) expande a
visão unidimensional para englobar aspectos fora do momento eleitoral. Sua classificação
é baseada no modelo de consciência de classe e prevê quatro modalidades, as
quais são divididas segundo o tipo de solidariedade dominante (se privada ou
pública) e pelo contexto de ação (se estatal ou não). As modalidades são:
profissionalismo político, participação civil na política, movimento social e
subcultura.
O
trabalho de PATEMAN (1992) propõe uma classificação derivada do modelo de
PIZZORNO (1975) com a identificação de três categorias analíticas:
pseudoparticipação (cidadão atua através da emissão de opiniões, protestos mas
não participa da tomada de decisão), participação parcial (grupos sociais ou
indivíduos não exercem poder sobre o resultado final dos processos decisórios)
e participação plena (inclui também o voto e todos que deliberam tem igual
poder na tomada de decisão).
Em
AVELAR (2004) a autora define três canais de participação política: canal
eleitoral (votar, reuniões de partidos, contribuir para campanhas etc), canal
corporativo (representação de interesses de organizações profissionais,
empresárias etc no sistema estatal) e canal organizacional (espaço não
institucionalizado da política, como exemplo temos os movimentos sociais).
Na
próxima seção mostraremos como a Internet influencia o canal eleitoral.
3- INFLUÊNCIA DA INTERNET NA
PARTICIPAÇÃO POLÍTICA
A Internet aumentou a capacidade de
comunicação e disseminação de informações da sociedade. Desde o seu surgimento
ela vem sendo utilizada por políticos, partidos e instituições na tentativa de
aumentar a interação com os cidadãos. Diversos estudos, entre eles o de NORRIS
(2003), mostram que o potencial da Internet para o aumento da interatividade
entre instituições políticas e cidadãos tem sido subutilizado. Websites de
partidos e políticos são utilizados na maioria das vezes para prover
informações de maneira unidirecional assim como o fazem o rádio e a televisão.
O surgimento das redes sociais
digitais (RSDs), como exemplo temos o Twitter e Facebook, aumentaram ainda mais
o potencial da Internet para interação. Novamente as instituições políticas
subutilizam o potencial de interação dessas redes e as usam predominantemente
para disseminação de informações.
Apesar de subutilizada, a Internet e
as RSDs exercem uma grande influência em todos os canais de participação política.
Em relação ao canal eleitoral, AGGIO
(2011) coloca que devem ser consideradas 4 questões chaves para campanhas
online e que podem ser utilizadas para se entender as influências de Internet
nesse canal, a saber: fornecimento de informações não mediadas pelos media
noticiosos, paridade entre campanhas de pequeno e médio porte, interatividade e
ativismo.
As RSDs exercem forte influência em
cada uma dessas questões. Apesar de partidos e políticos as utilizarem
predominantemente para fornecimento de informações não mediadas (não mediadas
pelos meios tradicionais – rádio, televisão, jornal etc -, mas com
enquadramento favorável a partido e/ou político), essas redes parecem absorver
as campanhas realizadas por rádio e televisão e promover uma interação entre
seus usuários na discussão dos temas apresentados. O gráfico da figura 1 mostra
que a medida que a campanha na televisão se intensifica aumenta também o número
de comentários sobre os candidatos nas RSDs. Os picos mostrados nos dias
14/10/2014 (321.645 tweets) e 24/10/2014 (483.904) mostram uma relação direta
entre o número de comentários nas RSDs e os debates promovidos pelas redes Band
e Globo, respectivamente. Em 26/10/2014, dia do segundo turno das eleições
presidências, temos o recorde no número de menções aos candidatos com 731.984
tweets coletados. Analisando os dados em relação à quantidade de tweets por
usuário, percebemos que estes podem ser divididos em pelo menos dois grandes
grupos: usuários esporádicos e usuários ativistas. O primeiro grupo é
caracterizado por usuários com baixo número de tweets emitidos e que apenas
repassam a informação recebida emitindo um ponto de vista em relação ao tema. O
segundo grupo se caracteriza por usuários com alto número de tweets que tentam
convencer os demais usuários sobre o seu ponto de vista em determinado tema ou
sobre determinado candidato.
Figura
1- Formulação do autor
Em
relação ao grupo de ativistas, percebemos que a Internet e as RSDs permitem que
pessoas comuns expressem suas opiniões fazendo inclusive militância nessas
redes. Nos dados coletados o usuário recordista com 5720 tweets no período de
coleta foi José Aloise Bahia, jornalista de Belo Horizonte, MG. Sua atuação no
Twitter foi em defesa da campanha da candidata petista Dilma Rousseff. A figura
2 mostra os usuários que mais “twitaram” sobre os candidatos à presidência nas
eleições 2014. Observamos que a lista é composta principalmente por “usuários
comuns” (nesse caso caracterizados como ativistas) que militam para um
determinado partido/político. Isso confirma que o baixo custo uso das redes
permite uma maior participação de agentes da sociedade em campanhas online.
Outro fato interessante é que entre partidos/políticos apenas os perfis “Dilma
Rousseff 13” e “Dilmais2014” aparecem entres os com maior número de tweets.
Isso revela um predomínio da candidata Dilma Rousseff sobre os demais
candidatos nas redes sociais digitais (pelo menos em termos quantitativos). O
êxito da candidata nas urnas revela a importância da adequada utilização desse
meio de comunicação durante a campanha online.
Figura 2 – Formulação do autor
CONCLUSÃO
As análises mostraram que a Internet
possui o potencial para influenciar e alterar as formas de participação
política no canal eleitoral. Essas potencialidades ainda são subaproveitadas,
mas se tornaram evidentes na análise da campanha online nas eleições 2014. As
instituições representativas (partidos e políticos), ainda não se adequaram de
forma efetiva a lógica das redes digitais. O baixo custo de uso das redes
associado à diminuição da exclusão digital no Brasil revela a possibilidade do
aumento do número de ativistas políticos. Os partidos/políticos que melhor
souberem se adequar a essa nova realidade provavelmente terão melhores
resultados nas urnas nos próximos anos.
Para se formar um entendimento mais
aprofundado do comportamento político na Internet e nas RSDs é necessário a
realização de uma análise não só quantitativa, mas também semântica, do que é
produzido nessas redes. Esforços nesse sentido podem ser vistos no trabalho de
CRUVINEL (2014). Além disso, é necessário estudar o canal eleitoral em conjunto
com os demais canais sistematizados por AVELAR (2004).
No
canal corporativo, como destaca MAIA (2011, p.74), as entidades de interesse
coletivo podem utilizar a Internet para ampliar o escopo de suas ações e
reduzir os custos operacionais. Dessa
forma, a aplicação da Internet não chega a mudar a ação política pré-existente.
Por outro lado, considerando que as organizações nesse canal possuíam um acesso
“privilegiado” as instituições políticas e meios tradicionais de comunicação em
massa, a Internet parece criar uma concorrência para esse canal ao dar “voz” a
outros segmentos da sociedade.
O
canal organizacional parece ser o mais influenciado pela Internet e as RSDs.
Nesse canal, movimentos de protesto eclodiram em todo o mundo. A maioria desses
movimentos foi organizada através das redes sociais digitais, principalmente
Facebook e Twitter, e possuía uma estrutura descentralizada e sem líderes.
Nesse contexto, as estruturas das instituições representativas se mostraram
despreparadas para lidar com esses movimentos.
Percebemos
assim, necessidades de adequação das instituições existentes à influência da
Internet em todos os canais de participação. Esforços no sentido de mostrar as
mudanças ocorridas em cada canal com as novas formas de comunicação e a
inter-relação entre elas serão empreendidos em trabalhos futuros.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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Política. In: AVELAR, Lúcia; CINTRA, Antônio Octávio. Sistema político
brasileiro: uma introdução. Rio de Janeiro:
Konrad-Adenauer-Stiftung, 2004.
BORBA,
Julian. Participação política: uma revisão dos modelos de classificação.
Sociedade & Estado, Brasília, v. 27, n. 2, p. . 263-288, 2012.
AGGIO,
Camila de Oliveira. Internet, eleições e participação: Questões chave acerca da
participação e do ativismo em campanhas Online. In: Internet e Participação
Política no Brasil, 2011, p. 175-193.
CRUVINEL,
Gustavo Warzocha Fernandes. ANÁLISE DE SENTIMENTOS EM REDES SOCIAIS DIGITAIS -
Uma aplicação no contexto político, 2014.
CREMONESE,
Djalma. Participação cabe em qual democracia.
JURIS,
J.S. The new media and activist networking within anticorporate globalization
movements. The Annals of the American
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MAIA,
Rousilei Celi Moreira. Internet e esfera civil: Limites e alcances da
participação política. In: Internet e Participação Política no Brasil, 2011, p.
47 – 91.
MILBRATH, L. W. e GOEL, M. L. (1965), Political
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NORRIS, P. Preaching to the Converted? Pluralism,
Participation and Party WebSites. Party Politics, v. 9,
n. 1, 2003, p. 21-45.
PATEMAN,
C. Participação e teoria democrática. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1992.
PIZZORNO,
A. Introducción al studio de laparticipación política. In: PIZZORNO, A.;KAPLAN,
Marcos; CASTELLS, Manuel. Participatión y cambio social em la problemática
contemporânea. Buenos Aires: Siap Planteos, 1975. p. 13-82.